A República contra a Máquina

1- Não o mero viver, mas a busca da vida bela. 2- A Liberdade não se negocia, a Paz sim. "Pode-se imaginar um prazer e força na auto-determinação, uma liberdade da vontade, em que um espírito se despede de toda crença, todo desejo de certeza, treinado que é em se equilibrar sobre tênues cordas e possibilidades e em dançar até mesmo à beira de abismos. Um tal espírito seria o espírito livre por excelência" (Nietzsche. Gaia Ciência, parágrafo 347)

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quarta-feira, fevereiro 28, 2007

Intolerância Iluminista

Não é nenhuma novidade saber que existem elementos autoritários no pensamento iluminista, tão comentados desde a "dialética do esclarecimento", de Adorno e Horkheimer. Um exemplo de autoritarismo e elitismo iluminista está na divisão entre uma minoria esclarecida e uma massa ignorante que precisa ser guiada à luz pelos intelectuais que usam a razão. A razão prevalecerá sobre os instintos baixos, que predominam no povo...

À parte ser mais fácil acreditar em duendes do que na lenga lenga racionalista, principalmente depois da Nietzsche, Freud, Marx, Foucault.... uma coisa me incomoda nessa polêmica em torno do artigo do Prof. Janine: o autoritarismo presente no artigo do Prof. Andrea Lombardi, no caderno Mais! (25/02/07), que sem usar argumentos, sem debater, procurou desqualificar o Prof. Renato Janine mostrando como Janine não era iluminista. Isso é escolástica! É dogmatismo, supõe que existam algumas verdades, "descobertas" pelos filósofos franceses do séc. XVIII, que não podem ser questionadas.

Temos a obrigação de sermos iluministas? Até que ponto o prof. Lombardi é um "livre pensador", pois este é aquele que é capaz de questionar seus próprios pressupostos. Como Janine parece ter feito. Até que ponto ele não está sendo um "escolástico" iluminista que foge de uma verdadeira discussão?

Paradoxalmente, os iluministas de hoje - liberais de esquerda e de direita - tem um discurso da tolerância, da liberdade de expressão... mas na prática mostram-se extremamente intolerantes quando seus dogmas são questionados. O que tenho visto é uma espécie de inquisição iluminista contra o Prof. Janine, que foi comparado até com Hitler, só por não perdoar as pessoas que arrastaram um garoto por 7 km.

7 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Prof. Janine? Um professor precisa ensinar algo, coisa que um comentarista de ética não pode fazer.
Temos a obrigação de sermos iluministas? Para um iluminista, sim. Para um livre pensador, que, ao questionar seus pressupostos,acaba por andar sobre o vazio, pregando com a eloqüencia de um criado-mudo, a resposta é indiferente. Ao fitar o nada, ele o fita de volta.
Janine não pode ser comparado a Hitler, um homem de ação: a indignação do padreco é letárgica, leguminosa.
E Marx? Não é o teórico do comunismo o mais ilustre filho do kantismo, o Moisés do reino dos fins?

01 março, 2007 14:38  
Blogger Jean Gabriel said...

Quando você diz que para um iluminista é obrigação ser iluminista, você está relativizando, está afirmando que o iluminismo é apenas um ponto de vista. O que eu acho correto, mas que é contrário ao que pensam os própios iluministas, que acreditam que a razão descobre verdades universais, validas para todos em qualquer contexto. Então para um iluminista consequente só existe uma posição verdadeira. Não há perspectiva.

O livre pensador anda sobre o vazio mesmo, mas isso não significa que ele tenha que ficar lá. Ele pode criar novos valores, ele pode aderir a um valor existente, mas não porque acredite que ele é "verdadeiro", mas porque o acha belo.

E concordo com você que o Janine não é um homem de ação, assim como eu não sou e provavelmente você também não é.

01 março, 2007 18:22  
Blogger Jean Gabriel said...

Admitir que não somos homens de ação não significa que eu ache isso bom. É apenas uma constatação. Temos que agir, encontrar espaço para a ação.

02 março, 2007 11:31  
Blogger Unknown said...

Brutus, foi ótimo o seu texto. Pena ter gasto sua defesa num artigo fraco como esse do Prof. Janine; achei esse tom de indignação e "sede de vingança" dele um tanto patético. Agora uma pergunta: Como você rebate o argumento de que a vingança do Estado iguala a sociedade (os "homens de bem") ao fascínora punido? Se me convencer, talvez eu passe a acreditar na pena extrma...Pense também que no Brasil sabemos que a polícia é corrupta e a Justiça só pune o pobre, e os erros judiciários (sejam mal intencionados ou não) são mais comuns que se pode imaginar...Além disso o Estado que mata é mais um lemento de repressão e arbitrariedade, e o tema do seu blog é LIBERDADE, ou estou errado? Continue postando daí que eu seguirei provocando daqui...Abs,PP

04 março, 2007 22:06  
Blogger Jean Gabriel said...

Pedro,

Eu também não achei o artigo do prof. Janine bom, apenas achei exagerada a reação a ele.
Concordo com você que não seria uma boa solução a aplicação da pena de morte no Estado brasileiro atual. Afinal, temos todo o problema das causas sociais da violência, que não estariam sendo atacadas...

Mas não necessariamente a defesa da pena de morte é algo que atente contra a LIBERDADE, que é o mote deste blog. Pois em um autogoverno como o ateniense a maioria da população poderia decidir livremente (nesse caso em assembléia com no mínimo 6.000 cidadãos) se um assassino deveria ser condenado à morte ou banido. Era uma decisão democrática.

O monopólio do Estado na coerção e na produção de leis é coisa recente na história. Começou com o Estado absolutista (a partir do séc. XVI), e não nas democracias antigas nem nas repúblicas renascentistas. O sistema prisional e a polícia nos moldes atuais só surgiram a partir do séc. XIX na Inglaterra e na França, que ainda não adotavam o sufrágio universal e tratavam a questão social como assunto de "polícia".

A questão é complexa.

Agora, não condeno o sentimento de vingança. Não acho digno que o pai daquela menina que foi estuprada uma semana e esquartejada tenha perdoado os criminosos. Não gosto desse negócio de oferecer a outra face. Prefiro os valores anteriores à religião dos galileus. Não o condenaria se ele tivesse ido matar os assassinos de sua filha. Creio que ele até teria uma chance no júri popular.

Aí entra outro ponto. A indignação contra o crime e a vingança não são simplesmente individuais. Um dos pais da sociologia, Durkheim, escreveu sobre "O normal e o patológico". Uma taxa de crimes sempre existirá, é normal. Quando a taxa cresce demais alguma coisa está errada. A sociedade pode estar vivendo uma anomia (ausência de regras) uma desintegração social. Mas tem um outro lado do crime. O crime tem uma função social! Quando uma comunidade fica indignada ou quando reprime um criminoso até mesmo em um linchamento o que está sendo reforçado neste momento? Os valores coletivos compartilhados por todos. Os laços sociais. O crime, ao ser reprimido pela comunidade, contribuiu para o reforço dos valores coletivos.

Quando não há mais indignação, é porque não há mais força em nenhum valor coletivo. Prevalece o individualismo.

Agora eu faço uma pergunta e a deixo no ar:
Os direitos humanos, ao colocar o foco no indivíduo e ao impedir ou recriminar as manifestações de indignação popular, não reforçam o individualismo?

Abs

05 março, 2007 17:44  
Anonymous Anônimo said...

Não percebo a relativização na afirmação de que o iluminista vê sua posição como obrigação. Para o iluminista o Iluminismo é, sim, um ponto de vista, ou melhor, o ponto de vista da Razão, o que, a seus "olhos", o torna obrigatório. Quanto à diferença entre "verdadeiro" e "belo" na esfera da moral, não vejo na prática - e só importa a prática! - divergência alguma.
Desculpe-me por retomar essa discussão; esse tal de Janine, pelo que tem dito, estaria bem pago se todos dessem de ombros a suas patetices, porque não passam disso seus devaneios sentimentais, que se encaixariam melhor num diário de moça pudica indignada - oh, a indignação das meninas!
Bem, retomei esse assunto porque hoje há um artigo na Folha Ilustrada que, ainda que tenha a impressão de que você não concordará com ele por completo, expressa o caráter dogmático das Luzes que, bem apontado por você, parece escapar à intelectualidade semi-alfabetizada que teima em pastorear a "massa" que faz sua prece matinal ajoelhada diante dum jornal. O artigo é de João Pereira Coutinho, que, depois de falar em "virtudes naturais", faz o sinal da cruz ao referir-se a Robespierre, Mao, Lênin e Hitler. Por sinal, malditos ingleses - maldito Chamberlain! - por terem dado tanta corda ao führer, fazendo com que qualquer filisteu o coloque ao lado de Robespierre e Lênin como um inimigo da "civilização".
Quanto ao dilema de Pedro, lembre-se de que para os gregos a vingança era considerada mais doce que o mel - e eles tinham o mel do Himeto! Mas os gregos, que civilização mais bárbara!
Matar o homem errado é grotesco. Entretanto, em não havendo dúvidas quanto ao merecedor da vingança - e não falo em dúvida razoável, não deve haver dúvida alguma, deve-se ter a mais cristalina certeza - que mal há em adiantar o inevitável para aquele que perder completamente a medida?

07 março, 2007 10:38  
Blogger Jean Gabriel said...

Tamerlão,

Concordo com você quanto ao sentimentalismo piegas de Janine. Quanto ao iluminismo ser um ponto de vista discordo. Você disse que, para o iluminista, o iluminismo é o ponto de vista de quem usa a razão. Ou seja, se você pensa, será iluminista. Então para eles há apenas uma verdade, que é descoberta por eles, que fazem a razão prevalecer sobre sentimentos, paixões, contexto histórico etc.

Se há "verdade" – ainda que nós não tenhamos completo acesso a ela – e a verdade só é acessível pela "razão", não há verdadeiramente ponto de vista, mas sempre uma posição que é a correta e outra que é a falsa. Só há um ponto de vista verdadeiro. Os outros são falsos. Mas pensar em termos de "ponto de vista" é justamente mostrar que ambos são verdadeiros, que os pontos de vista estão na verdade "disputando o poder".

Isso é o que já diziam os sofistas: "estabelecemos discursos e discutimos, não para chegar à verdade, mas para vencê-la. É um jogo: quem perderá, quem vencerá?"

Sócrates não queria discutir a não ser para dizer a "verdade". Não havia "diálogo" platônico na verdade, ele sempre vencia a priori. Por isso, ele nem se interessava em participar da política, das assembléias. Para os sofistas, discuro é disputa de poder. Por isso, eles se interessavam em participar da política e valorizavam a democracia ateniense. Sócrates era contra. Queria uma ditadura dos "filósofos", "iluminados". Ele não queria disputar.

Agora, se nós podemos até falar em "verdade" nas "ciências da natureza", descobrindo "leis" e transformando a natureza, não acredito que a razão seja capaz de encontrar a verdade para a existência do homem. A razão é incapaz de dizer qual é a maneira "verdadeira" de viver. Qual é a verdadeira, e melhor, forma de sociedade, de estado, de costumes.

A razão é incapaz de comparar valores. Não há uma resposta racional para o dilema do que fazer com os assassinos do garoto que foi arrastado por 7 km. É sempre um juízo de valor que determinará a escolha. Para um cristão "esclarecido" eles devem ser apenas presos, pois eles "não sabem o que fazem" e "também são vidas". Um popular, talvez queria dar o troco nos assassinos. Para um antigo não haveria dúvida nenhuma. Depende do conjunto de valores estimados pelo que julga. Não da "razão".

07 março, 2007 12:23  

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